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Estágio de convivência e Adoção: o dilema entre o tempo da pandemia e o tempo das crianças

As crianças acolhidas institucionalmente vivem a cada dia a espera de um recomeço em suas vidas, onde tenham a oportunidade de deixar a instituição para que possam finalmente vivenciar dias de alegria, afeto e amor em um lar seguro e saudável, seja para retornar para a família de origem ou extensa, ou para ingressar em uma família substituta disposta a adotá-los.

De acordo com dados do Sistema Nacional de Adoção (CNJ), existem atualmente aproximadamente 34 mil crianças e adolescentes em instituições de acolhimento em todo o Brasil, sendo que destas cerca de 5.040 estão totalmente prontas para adoção.

 Entretanto, em época de pandemia, onde tudo parou por um momento e onde todos estão tendo que se adaptar ao “novo normal”, como ficam os processos e ações voltados a adoção?

Pois bem, diferente do que alguns podiam imaginar, diante da atual situação pandêmica, a justiça tem buscado acelerar alguns processos de adoção, como forma de tentar reduzir a quantidade de crianças e adolescentes acolhidos, visando minimizar as chances de contaminação pelo novo coronavírus.

No dia 17 de abril de 2020, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) divulgou em uma edição extra do Diário Oficial da União, uma série de diretrizes[2] com ações especiais de proteção a crianças e adolescentes que estão sob medida protetiva de acolhimento em meio ao período de pandemia da covid-19. O texto discorre acerca de uma série de recomendações para preservar a saúde e a segurança de crianças que estão, por decisão judicial, afastados do convívio familiar formal, em condição de guarda provisória ou em instituições de acolhimento. As medidas também têm como objetivo resguardar os profissionais da assistência social.

Tais recomendações têm o objetivo de reduzir o fluxo intenso de pessoas nas unidades de acolhimento e, quando possível e respeitando as condições legais, conduzir as crianças e adolescentes para ambientes mais resguardados. Uma das orientações, e a que quero me ater aqui, é a priorização de procedimentos para concessão de guarda provisória a pretendentes a adoção previamente habilitados, mediante relatório técnico favorável e decisão judicial, nos casos de crianças e adolescentes que se encontrem em estágio de convivência para adoção. Ou seja, permitir que os protegidos deixem as instituições de acolhimento para passar a conviver em ambiente familiar, desde que a mudança seja avaliada por equipe técnica e autorizada por decisão judicial.

Dessa forma, temos percebido por parte do juiz competente do munícipio de Curitiba-PR, essa aceleração em ações de desacolhimento das crianças para uma consequentemente adoção, não apenas como forma de preservar a saúde das mesmas, mas como forma de dar a elas uma família e lar digno, que elas tanto precisam e merecem.

A adoção é precedida de várias etapas e ações sendo que uma delas diz respeito ao estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo máximo de 90 (noventa) dias, observadas a idade da criança ou adolescente e as peculiaridades do caso.

Quando se fala em estágio de convivência compreende-se o período de integração entre as pessoas envolvidas no processo de adoção, visando estabelecer bases sólidas para um relacionamento harmônico de caráter afetivo. Não é uma experiência qualquer e sim uma fase de conhecimento mútuo, natural e necessário para qualquer ser humano. (OLIVEIRA JÚNIOR, 2017).

O estágio de convivência é acompanhado pela equipe Inter profissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, a partir do momento que a criança é desacolhida e fica sob guarda provisória dos pretendentes habilitados.

À equipe técnica do acolhimento institucional, fica a responsabilidade de avaliar junto a criança acerca do seu desejo de ser adotada, bem como acompanhar os primeiros contatos da mesma com a possível futura família. Nesses primeiros contatos, analisamos a expectativa da criança frente aos pretendentes a adoção, bem como a interação entre os mesmos. Essa fase que precede o estágio de convivência, chamamos de estágio de aproximação.

Mas exatamente em que consiste o estágio de aproximação? Assim que temos conhecimento de que existem pessoas ou casal habilitado e interessado em adotar determinada criança, damos a notícia a mesma. A partir daí, a emoção já começa. Como descrever a alegria das crianças ao ouvirem que chegou a sua vez de finalmente terem a possibilidade de ter uma família que tanto almejaram? Os olhos brilham, os sorrisos vão de orelha a orelha, e como as vezes não conseguem descrever a emoção em palavras, dão pulo de alegria, literalmente.

Acredito que cada instituição tem sua forma de trabalhar esse período de estágio de aproximação, entretanto, na atual situação da pandemia, todas têm tido que fazer uso das ferramentas tecnológicas e virtuais. Em meio à crise, tais ferramentas têm mantido o sonho da adoção das crianças.

Aqui na ACRIDAS, antes de iniciarmos os primeiros contatos entre criança e as pessoas pretendentes a adoção, que são realizados por chamadas de vídeo, temos adotado a estratégia de trocar pequenos vídeos de apresentação de ambas as partes, como forma de “quebra gelo”. Nos vídeos, tanto a criança, como a pessoa ou casal se apresentam, falam do que gostam, bem como mencionam sobre seus sentimentos com esse momento.

Feito isso, damos início aos encontros e conversas por chamadas virtuais. É muito emocionante poder acompanhar esse processo. Logo de início no primeiro contato, as crianças se referem ao casal, por exemplo, lhes chamando de pai e mãe, ao invés de lhes chamarem pelo nome. Teoricamente, elas sabem, ou pelo menos lhes é explicado, que nesse começo nada ainda está certo, é apenas uma introdução, para averiguar a possibilidade das pessoas envolvidas, se interagirem e integrarem de maneira afetiva e satisfatória para que possam então se tornar uma família. Contudo, a necessidade de pertencimento familiar é tão intensa e intrínseca na vida desses pequenos, que ainda que eles não conheçam essas novas pessoas, ainda que eles nunca as viram ou soubessem de sua existência, é como se no coração deles já estivesse pronto esse lugar de afeto e amor, reservado para as pessoas certas, no tempo certo, só aguardando a nova família… o “novo pai” e a “nova mãe”.

Com isso, é visível a emoção dos futuros pais ao ouvir e sentir o afeto por parte das crianças. Pensando nisso, solicitamos a dois casais que se encontram em estágio de aproximação, que relatassem acerca do que têm sentido nesse momento. Confira os depoimentos a seguir:

– “Sentimos alegria a todo momento que lembramos da emoção do dia em que atendemos o telefone e recebemos a notícia de que finalmente teríamos os nossos filhos. nosso coração derreteu ali. Nosso primeiro contato com os nossos filhos foi através de um vídeo, o que nos fez ter mais certeza que a vida nos deu 2 presentes maravilhosos. Na nossa primeira chamada por vídeo, estávamos apreensivos, sem saber como seria, se os meninos iriam gostar de nós, se íamos conseguir conduzir uma boa conversa, conseguir passar pra eles o quanto esperamos por eles, por esse dia. Enfim, foi um dia tenso e feliz na mesma intensidade. Logo que vimos os rostinhos deles, bateu uma emoção, um misto de sentimentos e uma alegria imensa em ouvir a voz deles, ver os sorrisos. Ouvimos, de primeira, o tão sonhado pai e mãe, foi uma surpresa muito grande, ficamos meio bobos e anestesiados. Ao desligar, nos olhamos e ali a ficha caiu, agora somos PAIS! Emocionante!” (L. e W., 35 e 34 anos)

“Desde a ligação da Vara da Infância, nossa vida mudou! Um misto de felicidade e expectativa de sermos bons pais para nossas princesas. O dia da audiência, imaginei como uma sala de parto “elas estão a caminho”. O primeiro vídeo ficamos nervosos e ansiosos, será que seriamos como elas imaginavam? A primeira ligação, quanta expectativa! O que falaríamos? Elas iriam gostar de nós? E a hora que vimos aquelas duas princesas lindas e já nos chamando de papai e mamãe foi maravilhoso, emocionante e assim tem sido cada encontro de descobertas, amor e construção. Mas de uma coisa temos certeza elas são um presente de Deus em nossas vidas.”  (L. e A., 43 e 60 anos)

As chamadas virtuais tem a duração de dias ou semanas, dependendo de cada caso e da respectiva avaliação técnica. O passo seguinte é o encontro presencial, seguido de pernoites da criança na residência dos pretendentes, até que então as duas equipes, do juízo e do acolhimento institucional, possam avaliar o momento de promover o desacolhimento com a concessão de guarda provisória.

Tanto as crianças como o casal, apresentam grande ansiedade para a chegada desse momento. Entretanto, considerando sempre o princípio do melhor interesse da criança, tudo é analisado e avaliado com muita calma. Afinal, trata-se do futuro das mesmas e queremos que ele seja o melhor possível.

Quando chega o momento de despedirmos desses meninos e meninas, é impossível conter a alegria, emoção e, claro, as lágrimas. É uma imensa gratificação poder fazer parte desse processo de belo e grande “recomeço”. E não, não há nada que pague isso!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ASSUNÇÃO, Sheyla; Pozzebom, Eliana Rodrigues. Dia da Adoção: Brasil tem 34 mil crianças e adolescentes vivendo em abrigos. Disponível em: < https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/05/22/dia-da-adocao-brasil-tem-34-mil-criancas-e-adolescentes-vivendo-em-abrigos/>. Acesso em: 24 ago 2020.

BRASIL. Recomendação Conjunta nº1 de 16 de abril de 2020. Dispõe sobre cuidados a crianças e adolescentes com medida protetiva de acolhimento, no contexto de transmissão comunitária do novo Coronavírus (Covid-19), em todo o território nacional e dá outras providências. Diário Oficial da União. Disponível em: < https://www.in.gov.br/web/dou/-/recomendacao-conjunta-n-1-de-16-de-abril-de-2020-253004251/>. Acesso em: 17 ago 2020.

BRASIL. Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 16 jul. 1990. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm/>. Acesso em: 17 ago 2020.

MPPR. Disponível em: < http://crianca.mppr.mp.br/2020/04/268/COVID-19-Governo-publica-recomendacao-conjunta-para-criancas-e-adolescentes-em-abrigos.html/>. Acesso em: 17 ago 2020.

OLIVEIRA JÚNIOR, Eudes Quintino. Estágio de convivência na adoção. Disponível em: < https://www.migalhas.com.br/depeso/270389/estagio-de-convivencia-na-adocao/>. Acesso em: 17 ago 2020.

[1] Psicóloga Social na Associação Cristã de Assistência Social (ACRIDAS).

[2] Recomendação Conjunta nº 1 de 16 de abril de 2020.

Por Keyla de Oliveira Cataneo[1] – Psicóloga Social na ACRIDAS – CRP 08/20943

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